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Resenha Prática - A Nascente

Resenha Case Prático - Por Juliana Bravo, Associada II do Instituto Líderes do Amanhã


Apesar de não receber o reconhecimento que merece, Ayn Rand, escritora russo-americana responsável pela filosofia objetivista, ocupa posição de destaque na bibliografia daqueles que buscam expandir seus conhecimentos sobre liberdade.


Muito antes de ser associada do Instituto Líderes do Amanhã, um grande amigo me apresentou à Rand pela volumosa obra “A Revolta de Atlas”, cujas mais de mil páginas foram lidas por mim com uma sede voraz que, há muito tempo, eu não tinha por livros. A vida cotidiana, no entanto, me levou a focar na literatura técnica que eu julgava primordial para desempenhar bem meu papel profissional e, por alguns anos, esqueci da sensação transformadora que Rand me provocou.


Tudo mudou quando, já no meu primeiro ano de Líderes do Amanhã, o ciclo de leitura exibia uma outra obra da escritora: “A Nascente”. Meus olhos brilharam quando o livro chegou pelo correio. A arte da capa e o cheiro do papel me convidaram a percorrer cada capítulo com a mesma voracidade de anos atrás. O romance de Rand, publicado em 1943, se passa nos Estados Unidos, principalmente na cidade de Nova York, entre as décadas de 1920 e 1930, focando nos esforços do personagem principal, Howard Roark, para alcançar o sucesso pautado em seus próprios valores.


Roark é um modelo de independência. Ele tem como força-motriz sua verdadeira paixão pela arquitetura e está disposto a encarar as críticas de ser fiel ao que acredita. Apesar de a obra ser classificada como um romance, a filosofia de Ayn Rand pauta todo o desenvolvimento dos personagens que sustentam a história, o que traz uma outra dimensão para a leitura. Assim, os valores personificados pelo protagonista enfrentam obstáculos ilustrados pelos antagonistas, vilões e coadjuvantes.


O clímax de “A Nascente” se desenrola quando Keating (colega de faculdade de Roark que representa a ideia vulgar do egoísta), cuja carreira está em declínio, implora a Roark para arquitetar o projeto habitacional Cortlandt Homes. Pautado por suas ideias originais, Roark permite que Keating receba os créditos do projeto, com a condição de que os edifícios fossem erguidos exatamente como ele os havia projetado. Após descobrir que seu projeto não se concretizou sob as condições estabelecidas, o protagonista dinamita a deturpada obra-prima para impedir que sua visão original fosse subvertida.


O julgamento de Roark pela explosão é um momento muito marcante da obra. É nessa altura que somos inundados pela defesa do direito do criador ao produto de seu esforço, sob o argumento de que o indivíduo não é um escravo da sociedade, e que esta última tem direito à obra de um criador apenas pelos seus próprios termos. O protagonista é absolvido e alcança o sucesso fundado pela fidelidade à sua própria visão.


Esse é o herói de Ayn Rand: alguém cujo fim repousa em si mesmo de maneira racional e guiada por valores virtuosos. O enaltecimento daqueles que, por meio de suas próprias mentes, são capazes de gerar o progresso humano é o verdadeiro ode à grandeza e à racionalidade de que tratam a obra.


Ao terminar a última linha do livro, precisei de um tempo para analisar toda a densidade daquela visão de mundo contida nas muitas camadas da filosofia de Rand. As lições que extraí mudaram completamente a minha maneira de enxergar o trabalho e as minhas escolhas pessoais.


Crescendo em uma sociedade que exalta o coletivismo e que encara o “egoísmo” como imoral, não fomos, em grande maioria, apresentados à ideia da autopriorização no trabalho, tampouco em sermos honestos sobre o que, visceralmente, desejamos de verdade. Lembro-me de, no início da minha trajetória profissional, ter medo de fazer questionamentos porque acreditava que as pessoas pensariam que eu era estúpida por não ter as respostas. A supervalorização da opinião alheia em detrimento da minha – egoísta – própria voz, fez com que eu optasse muitas vezes por fazer aquilo que socialmente me traria mais conforto, renunciando ao que eu julgava o certo a ser feito.


Aqui eu preciso fazer uma contextualização. Meus pais fundaram uma empresa que atua em diversas frentes no setor de mineração. Contudo, eu sempre relutei muito em participar da organização, apesar dos esforços hercúleos do meu pai para me trazer para perto da realidade do negócio. Como criança que foge de injeção, fui morar fora do país durante muito tempo, abdicando de qualquer participação na empresa de mais de trinta anos. O que eu não esperava era que a minha vida pessoal fosse me trazer de volta para o ambiente profissional do qual eu tanto fugi.


Aos poucos, fui assumindo o setor jurídico da empresa familiar e percebi que eu tinha mais o que agregar àquela estrutura, apesar das naturais limitações de atuação. Quando, em 2022, decidi que, além de participar do processo sucessório da empresa fundada pelo meu pai, eu também empregaria meus esforços em estruturar a minha própria, a ansiedade tomou conta dos meus dias, afinal, eu nunca tinha capitaneado tantos processos de mercado ao mesmo tempo. Recebi uma enxurrada de críticas daqueles que, como se pudessem pensar por mim, julgavam inconsequente o aporte financeiro que eu estava prestes a fazer para abrir uma empresa de prestação de serviços de arqueologia.


Arqueologia? Sim, arqueologia. Constatei que, dentro do processo que envolve a mineração, a arqueologia tem papel prévio fundamental, visto que a existência de sítios arqueológicos muda completamente a forma com que empresários aplicam capital na exploração mineral. Uma pesquisa de mercado revelou que poucas empresas – no Espírito Santo e no Brasil, em números absolutos – dedicavam-se a estudos arqueológicos, o que poderia valer meu investimento na área.


A conclusão da leitura de “A Nascente” coincidiu com o exato momento em que eu tomava a decisão de investir meu capital nesse setor. Não foi uma decisão fácil, mas as lições aprendidas na obra integraram todo o racional por trás da minha escolha. Entrei de cabeça, estudei o mercado e me cerquei de pessoas comprometidas com a ideia de que o trabalho duro, sério e focado no objetivo eram a chave para decolar o negócio.


Na nossa primeira reunião de time, presenteei os colaboradores com algumas cópias daquele que foi o livro responsável por, justamente, estarmos ali naquele momento. Tomada por uma paixão nada habitual, dividi com eles – e agora com você, leitor - as lições mais valiosas. A primeira é de que não há nada tão importante quanto a liberdade. Liberdade também significa lidar com as consequências das suas decisões e omissões e, embora desafiador, assumir o controle da própria vida é a única maneira significativa de viver. Muitos covardes irão nos odiar, eu disse a eles, pois quem não lida com a responsabilidade individual e com a dor da sobriedade vira escravo dos próprios vícios. Apenas quando perseguimos nossos objetivos de forma íntegra e corajosa deixamos ser multidão.


Continuei a reunião dizendo que, apesar de sermos um time, todos ali tinham desejos egoístas e que seríamos tolos de negá-los por meio de um discurso vazio de moralidade. Nesse momento, percebi olhos arregalados na minha direção e resolvi explicar melhor. Como indivíduos livres que somos, temos desejos e objetivos diferentes, mas que, pautados pelos valores do respeito, da responsabilidade individual e da meritocracia, poderíamos fazer o nosso melhor naquele ambiente de trabalho para alcançá-los.


Avisei a todos que eu não era a senhora da razão. Que eu precisava que eles não fossem complacentes com todas as decisões da empresa e que se algo os parecesse estranho, eles teriam liberdade para endereçar o assunto. Não digam “sim” a tudo, eu insisti. Estejam dispostos a recuar e ser controversos. A vida fica ainda mais difícil quando entregamos nossos valores e objetivos aos caprichos dos outros.


Por fim, instiguei-os a se concentrarem na independência com responsabilidade e na busca do autoaperfeiçoamento contínuo, incluindo no lidar com os colegas de trabalho. Somente com a dedicação e trabalho de cada membro do time, transformaríamos uma ideia (fazer parte de uma empresa culturalmente forte e financeiramente lucrativa) em realidade.


A reunião acabou e senti que aquelas pílulas de Rand precisariam de algum tempo para surtirem efeito. Uma semana depois, um colaborador chegou tímido na minha sala dizendo que tinha começado a ler “A Nascente”. Poucos dias depois, um outro veio com a mesma notícia. Fazer parte da construção da cultura de uma empresa nova é uma responsabilidade enorme, mas ser fiel aos valores que acredito e agir cotidianamente pautada por eles tem um efeito muito grande. No último mês, recebi mensagens de inúmeras pessoas relatando como aquilo que eu disse na primeira reunião do time estava fazendo cada vez mais sentido e transformando a forma de encarar a vida de cada um deles.


Em menos de um ano de empresa, posso afirmar que os princípios abraçados desde o início fazem, hoje, parte da nossa cultura. Diferentemente do que aconteceu comigo anos atrás, ninguém tem medo de fazer perguntas, de contrapor uma ideia, de fazer sugestões ou de admitir as próprias limitações. Criamos um ambiente de confiança em que a liberdade com responsabilidade norteia cada ação e trilha um caminho de independência e sucesso individual que se refletem no crescimento da organização.


Ayn Rand disse que “a coisa mais difícil de explicar é a evidência que todos decidiram não ver”. Nesse sentido, “A Nascente” influenciou muito mais do que a minha decisão de investir em um negócio que poucos acreditavam, a obra mudou a minha forma de enxergar a própria liderança. Em um mundo de cinismos e heróis fracos, percebi que a fidelidade aos meus valores é a virtude sobre a qual a prosperidade floresce.


Juliana Bravo, Associada II.

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