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Resenha - Justiça: o que é fazer a coisa certa
Resenha Crítica - Por Matheus Amorim, Associado II do Instituto Líderes do Amanhã
Considerando um dos mais importantes filósofos de sua geração, Sandel leciona há mais de vinte anos na Universidade de Harvard, no famoso curso “Justice”, por onde passaram cerca de 15 mil alunos, em que discute e questiona os princípios contemporâneos de justiça. O principal objetivo do autor é passar ao leitor a sua visão sobre justiça, trazendo alguns casos concretos para reflexão.
A obra começa tratando dos conceitos que serão desenvolvidos ao longo do texto, demonstrando ainda como esses conceitos serão trabalhados ao longo dos próximos capítulos.
Sandel descreve que o conceito de justiça que abordagem estará (na obra) limitada às concepções de liberdade, bem-estar e virtude, cada uma analisada sob os pontos de vista de filósofos clássicos e modernos.
Um caso muito interessante que é abordado trata-se dos três sobreviventes de um naufrágio, que ficaram dias no mar e só não morreram de inanição, pois decidiram canibalizar outro sobrevivente que já estava doente e, por isso, morreria de qualquer forma.
O filósofo usa essa história para introduzir o conceito da moral utilitarista, que calcula os custos e benefícios e, através deste cálculo, analisa as consequências, de forma que a coisa certa será aquela que maximizará a utilidade.
Em seguida, o autor explica e crítica o princípio da máxima felicidade, que na sua acepção, é a teoria reduz, de forma equivocada, questões com importância moral em uma única escala de valores.
Segundo Sandel, aqueles que veem a justiça como uma forma de maximização da felicidade também enxergam na redistribuição de renda, o melhor caminho para atingir esse ideal de justiça, o que aqui no Brasil, se acostumou a chamar de “justiça social”.
É uma questão de utilidade coletiva, que pode também tomar caminhos perigosos, afinal, até onde se deve tirar dos mais ricos para melhorar a vida dos mais pobres? É um problema muito difícil de ser resolvido e que sempre, invariavelmente, acabará mal.
Mais para a metade da obra, o autor aborda a ideia de Kant, sobre a importância dos motivos e da equidade, de John Rawls. Para tanto, segue introduzindo que, se você é uma pessoa que acredita em direitos humanos universais, provavelmente não é um utilitarista.
Sandel explica que, para Kant, todos somos seres racionais, merecedores de dignidade e respeito, por isso a dignidade humana é importante no seu racional, já que ela define nossas concepções atuais dos direitos humanos universais. Kant repudia o utilitarismo. Kant afirma que a moralidade não deve ser baseada apenas em considerações empíricas, como interesses, vontades e desejos, pois um homem feliz não é, necessariamente, um homem bom.
Para Kant, o princípio supremo da moralidade deve ser estudado em função de contrastes, quais sejam a moralidade (dever x inclinação), a liberdade (autonomia x heteronomia) e a razão (imperativos categóricos x imperativos hipotéticos).
Ele segue explicando o conceito de estado natural de Locke e como, para o autor, a acepção de justiça só é encontrada quando imaginamos quais princípios concordaríamos em uma situação inicial de equidade. É aí que entra a teoria de John Rawls, que afirma que é o contrato social (que para muitos juristas é a norma fundamental da nação, ou a constituição), a posição original de equidade.
Finalmente, após falar sobre os dilemas da Lealdade, Sandel encerra sua obra explicando que, atualmente, nossas discussões políticas giram em torno do bem-estar e da liberdade.
Definir o que é justiça não é fácil. Talvez seja por isso que o famoso curso de Sandel continua a atrair milhares e milhares de estudantes nestes últimos 15 anos. Contudo, através da leitura, me parece claro que o autor busca, propositalmente, afastar o conceito de justiça da simplória explicação jurídica do termo. Para ele, a verdadeira acepção de justiça está na filosofia, sendo obtida através do estudo do comportamento da sociedade, de forma que as oportunidades sejam cada vez mais igualitárias para todos.
Esse é um ponto que merece destaque e, certamente, precisa de um debate mais sério na sociedade, aqui incluída a academia.
Como profissional do Direito, é necessário reconhecer que, para muitos dos juristas brasileiros, o conceito de justiça ainda fica muito limitado a acepções puramente jurídicas, muitas vezes desconectados da realidade.
Essa cultura, infelizmente, invade também os nossos tribunais, que acabam se esquecendo dos reflexos das suas próprias decisões no meio social, prejudicando a própria missão do Poder Judiciário, que é a pacificação social.
Por isso, leituras como estas precisam entrar com mais forças na academia, permitindo a formação de profissionais mais conectados com a realidade.

Matheus Amorim, Associado II.