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Resenha - De Zero a Um
Resenha Crítica por Juliana Bravo, Associada II do Instituto Líderes do Amanhã
Publicado em 2014, “De Zero a Um: o que aprender sobre empreendedorismo com o Vale do Silício” é uma obra do empresário e investidor americano Peter Thiel, que condensa lições aprendidas com a fundação e o sucesso do Pay Pal, empresa cofundada pelo autor, que se tornou bilionário no processo.
Thiel é alguém definitivamente fora da curva. Foi mestre de xadrez antes dos 21 anos de idade, concluiu um doutorado aos 25 e vendeu sua parte no Pay Pal por U$1,5 bilhão aos 35. Sua obra reflete seu espírito livre e disruptivo, diferenciando-se radicalmente de livros que oferecem as comuns estratégias de vendas e de planejamento de negócios. Com a ajuda de Blake Masters, Thiel desafia o leitor a pensar por si mesmo sobre questões como tecnologia versus globalização e monopólios versus mercados competitivos.
Em meio a pouco mais de duzentas páginas, é possível extrair ensinamentos valiosos, que passam, ao menos os mais marcantes, a ser reproduzidos aqui. Uma das grandes lições deixada pela obra é sobre como os maiores progressos se dão verticalmente e não horizontalmente. Usando a Apple como exemplo, quando seu computador pessoal ou mesmo o iPhone tornaram-se acessíveis para as massas, esteve-se diante de um progresso horizontal. Contudo, ter a ideia e criar a tecnologia necessária para que aqueles produtos existissem é o progresso vertical, é sair de zero para um.
Uma das razões que aumentam o progresso horizontal é a globalização e o consequente acesso a produtos por novos mercados. A obra relembra que o boom da internet no final dos anos 1990 fez com que o mundo das startups apostasse todas as suas fichas na globalização e não no desenvolvimento de novas tecnologias, valendo-se de (equivocadas) quatro regras básicas: fazer progressivos avanços incrementais; manter-se enxuto e flexível; ser melhor que a concorrência utilizando tecnologias já existentes; e focar no produto em detrimento das vendas.
Não é que a globalização não seja importante, já que esse processo amplia o acesso de produtos às massas. O declínio de muitas companhias que se pautaram nessas quatro regras e a própria finitude dos recursos, entretanto, destaca a importância de novas tecnologias que tornem o consumo mais eficiente, mesmo porque, há inúmeros aspectos da vida cotidiana que ainda demandam por melhorias. Se alguém almeja desenvolver uma ideia, criar uma startup que realmente mude o mundo, é preciso ir de zero a um, e não de um a muitos. Thiel afirma que, para isso, é imperioso questionar criticamente as suposições que temos sobre o presente. Vamos viver sem energias fósseis? É possível um mundo sem carros? Esse é o tipo de pergunta que se deve fazer quando o objetivo é criar algo inteiramente novo.
Nesse ponto da obra, somos apresentados a uma conclusão que muito se afasta da ideia geral que grande parte de nós cresceu escutando: monopólios não são ruins. Para o autor, monopólio significa que uma empresa é tão boa no que faz, que nenhuma outra consegue oferecer algo que se aproxime de a substituir. O Google é um excelente exemplo disso. As pessoas dão preferência a ele por o considerarem o melhor mecanismo de buscas na internet. Se uma outra empresa o superasse, isso significaria que seu mecanismo de pesquisa seria ainda melhor, o que beneficiaria a todos. Uma vez que o Google não precisa se preocupar com a concorrência, a empresa detém mais recursos para investir em seus funcionários, em seus produtos e em seu próprio impacto global. Monopólios só são prejudiciais quando a empresa permanece incontestavelmente nessa posição por muito tempo. Idealmente, novos monopólios devem surgir e acrescentar novas categorias de serviços e produtos. Thiel reescreve as antigas regras e revela que o segredo para criar um monopólio envolve resistir em copiar os modelos de negócio dos outros, ser ousado, focar em tecnologia própria, ter um plano (ainda que imperfeito), atentar-se às redes de distribuição, investir em vendas tanto quanto no produto e apontar para um mercado escalável.
Outra das valiosas lições da obra diz respeito à importância da visão para o progresso vertical da empresa. Thiel e sua equipe passaram anos trabalhando no Pay Pal, para que ele se tornasse o principal meio de pagamento dos usuários do ebay, alavancando sua posição de monopólio e culminando na venda bilionária da companhia. A visão grandiosa era o motivador de Thiel, então, o conselho do autor é justamente pensar grande, mirar na lua, pois, ainda que se erre o alvo, se estará entre as estrelas.
A obra adverte que mesmo aqueles que ambicionam descobrir algo novo são levados a se questionar: se há algo genial a ser descoberto, alguém já não o teria feito? A questão é que se algo soa impossível, o indivíduo tenderá a nunca o buscar. Quando olhamos em retrospecto, porém, foi o risco tomado por aqueles que tiveram ideias singulares que tornaram possível a existência de produtos e serviços que mudaram o jogo. A obra como um todo traduz, justamente, o valor da real inovação na vida das pessoas. Negócios que identificam as necessidades não atendidas do mundo, criam soluções para atendê-las e pensam “de zero a um” são os verdadeiros responsáveis pelas grandes disrupções. Thiel desafia crenças antigas do mundo do empreendedorismo, apontando o que é realmente necessário para criar algo capaz de se tornar o próximo grande monopólio e mudar o status quo.
Ainda que o leitor não planeje ser o fundador de uma startup de sucesso, “De Zero a Um” o fará pensar sobre suas aspirações de vida sob um novo aspecto, seja porque se questionará estrategicamente os caminhos aos quais o seu emprego o levará, seja porque se questionará em que grau suas próprias ações contribuem para um mundo melhor. Responder para si próprio os questionamentos levantados pela obra pode revelar se o trabalho da vida do leitor é “de zero a um” ou está mais para “de um para muitos”.

Juliana Bravo, Associada II.