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O combate às fake news e o fantasma da censura
Artigo de Opinião por Matheus Amorim, Associado II do Instituto Líderes do Amanhã
A liberdade é um direito fundamental do ser humano, pois está na essência de sua natureza ser livre. No entanto, como bem alertou o político e escritor John Philpot Curran “o preço da liberdade é a eterna vigilância”.
É irônico que, em meio à era da informação, quando a velocidade de transmissão de conhecimento alcança níveis nunca imaginados, tenhamos de assistir a ataques constantes à liberdade de expressão, sob a bandeira do combate às fake news.
Como se sabe, as fake news, ou notícias falsas, são informações enganosas que se espalham rapidamente por meio das redes sociais e da internet, muitas vezes com o objetivo de influenciar a opinião pública. Justamente por isso, o combate às fake news tem se tornado uma das principais preocupações da sociedade e dos governos em todo o mundo.
Essa preocupação é válida e importante, considerando a seriedade do tema. No entanto, o combate às fake news não pode ser usado como desculpa para censurar a liberdade de expressão, muito menos para calar desafetos ou para impedir a livre disseminação de ideias.
Infelizmente, é isso que se você, hoje, no Brasil. Vivemos, praticamente, em um Estado policial, onde o Executivo e Judiciário tomaram para si o direito de decidir o que pode e o que não pode ser dito, punindo severamente todos aqueles que ousarem divergir de seus modos de pensar.
O país inteiro ficou chocado com as reiteradas decisões de cancelamento de contas, silenciamento de personalidades e políticos e, em alguns casos, a censura prévia de produções cinematográficas, mesmo quando os fatos que eram apresentados se mostravam totalmente verdadeiros, como ocorreu com um documentário publicado pelo site Brasil Paralelo.
Um dos exemplos mais recentes é a criação, pelo atual governo, da Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia (PNDD), nome bonito para esconder sua real intenção, que é servir como meio de legitimar ações do governo contra aqueles que, por exemplo, critiquem suas políticas públicas (esta atribuição, está expressa no inciso II do artigo 47 do Decreto 11.328/2023[1])
Em outras palavras, sob a bandeira do combate às fake news, o governo, infelizmente, optou por seguir no caminho da censura, intimidação e litigiosidade, entrando em um caminho muito perigoso, que pode ser desastroso para toda a nação.
É verdade que ainda temos espaço para nos manifestar, caso contrário, você não estaria lendo este artigo. No entanto, o que estamos vendo é que o cerco vem se fechando cada vez mais e mais rápido. Voltamos a conviver com listas de “palavras e ideias proibidas”.
Essa atmosfera sufocante acabará por prejudicar as causas mais vitais de nosso tempo. A restrição do debate, seja por um governo repressivo ou por uma sociedade intolerante, invariavelmente nos torna menos capazes de participar da democracia, pois a livre troca de informações, pensamentos e ideias é a força vital de uma sociedade liberal e democrática. Afinal, como posso ser livre se uma ideia me é imposta, sem que eu possa expressar minha opinião?
O caminho deve ser outro para combater as fake news, pois nada de bom virá dessas atitudes autoritárias que atacam a liberdade de expressão. É preciso, ao contrário, adotar uma abordagem equilibrada e baseada em princípios, focada na educação, de forma que os próprios leitores sejam críticos ao que leem e verifiquem os fatos.
É na educação que reside a chave para combater as fake news, pois cidadãos devidamente educados, ensinados a pensar criticamente e analisar as informações com cuidado dificilmente serão levados a acreditar em qualquer absurdo que ouçam na internet.
Não se ignora que se trata de uma medida de longo prazo. Porém, nesse meio tempo, é plenamente possível que organizações privadas, desvinculadas das fontes de informação, atuem verificando fatos e ajudem as pessoas a identificar notícias falsas. Isso tende a gerar bons resultados, principalmente se essas mesmas empresas forem mais transparentes em relação à forma como suas plataformas funcionam.
Há que se respeitar a liberdade e a responsabilidade individual de cada um pela forma como se informa e pelo que acredita ou não. Essa tarefa, diferente do que entendem nossas lideranças, não pertence ao Estado, e a história nos mostra que todas as vezes em que ele assumiu esse papel, as coisas não acabaram nada bem. Basta ver o exemplo russo e chinês.
Cabe a nós, como cidadãos, permanecermos vigilantes, não permitindo que o combate às fake news continue a servir de bandeira para calar o debate público e atacar a liberdade de expressão, evitando, assim, que o fantasma da censura volte a nos assombrar, como parece ser a intenção alguns ocupantes do poder.
[1] Art. 47. À Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia compete: [...] II - representar a União, judicial e extrajudicialmente, em demandas e procedimentos para resposta e enfrentamento à desinformação sobre políticas públicas;

Matheus Amorim, Associado II.